COMO PREVER FALÊNCIAS - 40 ANOS
DEPOIS
Por Stephen Kanitz.
O artigo "Como Prever Falências", publicado há 38 anos na Revista EXAME, foi meu primeiro trabalho
acadêmico e talvez o mais conhecido. Introduzia no Brasil o conceito de
credit-scoring, e ficou conhecido como o Termômetro de Kanitz.
Neste artigo vou descrever como ideias
são lançadas e absorvidas no Brasil, um artigo mais de Sociologia do que de Finanças.
1) Hoje, 38 anos depois, são poucas as
coleções de bibliotecas, especialmente de Universidades, em que este número não
tenha sido roubado.
A revista de Dezembro de 1974, da
Exame, geralmente está faltando. Prenúncio do que direi mais embaixo.
2) No artigo mostrei um dos meus
modelos, não o melhor, e coloquei com todas as letras que possuía outros
modelos, com 25 variáveis que previam muito melhor.
Esperava receber uma fila de
interessados em saber como adquirir estes modelos melhores.
Não aconteceu.
Todos preferiram usar o modelo mais
simples de cinco variáveis, de longe o pior, mas grátis.
Pagar por consultoria, ideias, novos
métodos, jamais. O grátis é sempre melhor.
Por mais de 30 anos, a Exame recebia
cartas e emails pedindo uma cópia do artigo, nenhuma carta era endereçada a
mim.
É o país do "tudo se copia" e
do "tudo grátis", mesmo sendo pior.
Por isto, nosso ensino é da pior
qualidade, nossa saúde idem, mas pelo menos é de graça.
3) Um banco do Rio Grande do Sul, por
exemplo, aplicava-o sobre os seus próprios resultados quando o modelo era
claramente destinado à indústria e ao comércio.
Também não lemos instruções.
Aplicamos teorias administrativas e
econômicas desenvolvidas por ingleses e americanos, sem ler as instruções.
Sem perceber que aquelas teorias foram
criadas para a cultura inglesa e americana, não para a brasileira.
Mas mesmo assim copiamos, sem mandar
cartas ao autor.
4) O artigo apresentava cinco índices de previsão de insolvência que,
ponderados através de pesos cientificamente determinados, davam uma nota para a
empresa analisada, nota esta que determinava a sua saúde financeira.
Notas baixas indicavam péssima saúde
financeira, e consequentemente elevada probabilidade de falência. Notas
elevadas indicavam saúde excelente, e consequentemente empresas de baixo risco
de crédito.
Hoje, os pesos e os índices do artigo
de 1974 são obsoletos e incorretos, já que a situação econômica do país mudou
bastante neste período.
Mas pelos 20 anos seguintes, foi usado
sem pestanejar.
Secretarias da Fazenda de vários
Estados usavam para selecionar empreiteiras, apesar do modelo não contemplar a
área de serviços.
O único dinheiro que ganhei com este
modelo foi em pareceres jurídicos a favor de empreiteiras injustiçadas, onde
afirmava que o modelo fora usado sem a minha permissão. E que hoje, não previa
coisa alguma.
5) Para o meu espanto, acabou sendo
usado por uma série bancos e financeiras, sem a mínima preocupação de se
aprofundarem na metodologia que o gerou.
Este comportamento é bem elucidativo
quanto ao comportamento gerencial brasileiro, ávido na utilização de fórmulas
prontas.
Pior, três anos depois fiz uns
seminários para a Revista Exame sobre o assunto em cidades do interior, e
vários gerentes de bancos me disseram que o modelo funcionava a mil maravilhas.
O que não deveria ter acontecido.
É que todos os gerentes usavam o mesmo
modelo, e devo inadvertidamente cortado o crédito de muita empresa sadia, que
ao falir confirmaram a qualidade do meu modelo.
O meu termômetro era uma fórmula
pronta, para ser usado sem pensar.
Usamos fórmulas prontas sejam de autores
nacionais ou estrangeiros, sem o mínimo questionamento ou pelo menos um esforço
para adaptar os modelos genéricos às situações específicas de cada empresa.
Mais do que apresentar uma fórmula de
pronto uso, o artigo tinha por objetivo:
a. Que era possível prever uma falência
com certa antecedência, a partir dos demonstrativos publicados pelas próprias
empresas. Ideia inovadora na época.
b. Que os demonstrativos financeiros
publicados pelas empresas brasileiras são suficientemente fidedignos quanto à
realidade financeira, algo em que não se costuma acreditar neste país,
especialmente para empresas médias e pequenas onde tais demonstrativos eram
considerados totalmente falsos ou, pelo menos, inúteis.
O modelo e os outros que o seguiram
resolviam, para os analistas financeiros, dois problemas importantes:
a. Como balancear informações
conflitantes. (o que fazer com uma empresa que apresenta um aumento na liquidez
e uma elevação no endividamento ao mesmo tempo? 0 resultado destes efeitos é
uma melhora na situação financeira ou uma deterioração?);
b. Como comparar empresas entre si.
6) Embora usada por gerentes de bancos,
na época suas diretorias não se interessaram por Análise de Crédito. Tanto que
terceirizavam este serviço ao Serasa, mostrando que não fazia parte do Core
Business.
Core Business era ganhar com o float da
inflação, e o Brasil nunca adquiriu competência em empréstimos bancários e
financiamentos a empresas.
Somos campeões em taxas de serviço,
cartões de crédito, cheques especiais e descontos de duplicatas, que não é
exatamente financiar a produção.
7) Felizmente, o outro lado da Falência
é a Excelência, e usando o mesmo método criei a edição "Melhores e
Maiores", um sucesso de vendas até hoje.
Introduzi uma ponderação de índices
baseado no Termômetro de Kanitz no ano de 1977, a fim de determinar as melhores
empresas do país, baseado na soma de seis critérios.
O modelo publicado em EXAME foi
elaborado para prever falências no período de 6 a 12 meses, o período que
demorava para sair a publicação.
O maior medo dos editores era premiar
uma empresa que pedisse concordata logo em seguida da edição ser colocada nas
bancas.
O que ocorreu uma única vez, não devido
a empresa em si, mas devido à má situação financeira da holding.
Infelizmente, não sei o motivo, esta
metodologia foi abandonada pela Revista Exame e não me surpreenderia em ver uma
concordataria na lista das melhores no futuro.
8) Pelo exposto, fica claro que para o
Brasil dar Certo é necessário um sistema de Patentes rápido e eficiente, que pelo
que já vimos ainda não ocorre no Brasil.
Até lá, cuidado com
suas ideias. A maioria vai querer roubar, ao invés de contratá-lo e ter a
melhor ideia possível.
Fonte: Blog do tephen Kanitz.
Matéria enviada pelo Pof. Flávio Dantas e postada por Werley Novais.
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